sábado, 2 de junho de 2007

(RE) ENFOQUE SOCIOLÓGICO SOBRE O SISTEMA EDUCATIVO CABO-VERDIANO

Para os Técnicos Superiores, Dirigentes e Altas Instâncias do MEES - Ministério da Educação e Ensino Superior - Palácio do Governo - Várzea, Praia...do Técnico Superior mais recente do GEP - Gabinete de Estudos e Planeamento - MEES

A pesquisa que tem sido feita através de documentos relacionados com o sector educativo, durante algum tempo, sugere uma apreciação de carácter diferente, do que a feita a nível estatístico e/ou de planeamento. É no sistema educativo que focalizamos esta análise por ser ele o suporte com características de continuidade para o aluno, ao longo do que pode ser um percurso de aprendizagem.

É na desordem social que é possível analisar, reflectir, propor melhorias. E essa desordem existe em qualquer parte, com mais ou menos intensidade e em vários sectores da sociedade. Propomos avançar com a educação, nossa área de trabalho.Tomamos a liberdade para falar sobre o sistema educativo cabo-verdiano, por termos dado uma importância maior sobre o mesmo, e que requereu uma insistente leitura da nossa parte, desde o começo das actividades no GEP-MEES.

Para quem vem de fora, e depara-se com um sistema educativo que tenta gerir os problemas, as dificuldades estruturais, tentando que as crianças tenham oportunidade no ensino, como objectivo fundamental com a condicionante do país não ter muitos recursos económicos e mesmo assim, apostando em grande parte na educação, percebe que há muito trabalho para ser feito, para além do que se tem executado.

Pelo que pudemos analisar do sistema educativo iremos abordar este assunto por sub-sistemas.

Para se entender melhor os constrangimentos da educação pré-escolar é preciso saber que as “condições da sociedade cabo-verdiana, conduzem a uma situação de ausência de família, simultaneamente moral e física, por razões de vária ordem: pobreza estrutural, baixo nível de conhecimentos, famílias monoparentais, famílias difíceis (álcool, droga, violência, abuso sexual), qualidade deficiente da comunicação entre a família e os profissionais dos diferentes serviços sociais, alteração profunda das normas familiares tradicionais…”[1].

Neste cenário torna-se complexo pensar numa educação pré-escolar. Segundo o Plano Estratégico da Educação tem-se registado alguns progressos devido às diversas disposições legais tais como o Código de Menores, os dispositivos sobre a educação especial contidos na Lei de Bases do Sistema Educativo, entre outros. De carácter facultativo, o ensino pré-escolar devia ser possível para todas as crianças na idade dos 3 até à idade de entrarem no ensino básico, pois além de permitir um desenvolvimento cognitivo, seria benéfico em termos de socialização, de disciplina, que podem não encontrar em casa, especialmente no caso das famílias acima referidas. Mas na prática, encontramos ainda meninos da rua, crianças que estão sob a guarda de irmãos mais velhos, ou seja estão num ambiente que em nada os favorece.

Aqui levanta-se uma questão. Antes de falar em educação, talvez seja prioritário falar sobre o problema da família em Cabo Verde.

O exemplo cabo-verdiano é, contudo, outro. Da obra “Combates pela História”, de 2004,retiramos “Espantada, a elite política bem pensante chocou-se com o facto de 80% de as crianças cabo-verdianas nascerem fora do casamento. Ou de uma relação estável.” Parece assim, que a convivência familiar não será segundo o mesmo autor “ a guardiã de valores de integração social”. Ao inverso dos discursos mais puristas, a realidade é que em Cabo Verde não podemos falar de um núcleo familiar, pois as ligações entre os ascendentes são frágeis e transitórias.

A protecção da família cabo-verdiana tem que ser uma prioridade da sociedade e do Estado com a adopção de atitudes e políticas, tendo em conta a instabilidade da mulher e sobretudo dos filhos.

Tendo a consciência destes indicadores e actuando de forma moralista da parte do Estado, induzindo valores e com um conhecimento sociológico da estrutura familiar que se pretende mudar, os objectivos e as metas a alcançar pelo Plano Nacional de Desenvolvimento (PND) para o ensino pré-escolar podem ser positivos.

Em relação ao ensino básico obrigatório de seis anos, é óbvio que o sucesso escolar está intrinsecamente ligado à frequência do ensino pré-escolar. Segundo o PEE, os pontos fracos são vários o que se traduz, quiçá, na baixa participação dos pais nas actividades da escola. Este último ponto fraco prende-se com certeza, com o que se vem dito até agora sobre a situação familiar em Cabo Verde.

Estas fragilidades requerem a adopção de estratégias de natureza qualitativa e que se prendem com: a formação de professores; a pertinência das aprendizagens de base (lecto-escrita e matemática); o sistema de gestão da avaliação por fases; a gestão e avaliação das escolas pólo; o apoio e seguimento pedagógico a nível de concelho; a disponibilidade dos recursos pedagógicos; as parcerias entre a escola e a comunidade; os apoios socioeducativos. Achamos que são passos decisivos para uma melhoria do ensino básico.

Já diz o ditado que “é de pequenino que se torce o pepino”, e a criança, é no seu início de aprendizagem que ganha bases para se formar num homem com instrumentos para o seu futuro. Ora, essa bagagem cultural só é conseguida se a forma de ensino for eficiente. Aprender a aprender, depende muito de quem ensina, daí que apostar na formação profissional de professores é preciso com prioridade no ensino básico. Também necessário, será incluir nas disciplinas de matemática e português, outras formas pedagógicas que estimulem e exercitem o aluno nestas áreas.

Em relação à alfabetização e educação de adultos o relatório sobre a Educação Para Todos (EPT) - 2006 adopta como definição prática aquela dada pela UNESCO (1978): da “alfabetização funcional” – “Uma pessoa é alfabeta do ponto de vista funcional se ela pode se dispensar todas as actividades que requerem a alfabetização para fins de um funcionamento eficaz do seu grupo ou da sua comunidade e também para lhe permitir continuar a utilizar a leitura, a escrita e o cálculo para o seu próprio desenvolvimento e o da comunidade.”

A alfabetização é um direito que procura benefícios específicos, independentemente do facto de ela ser adquirida no decorrer da escolarização ou pela participação de programas de alfabetização para adultos. Parece que os programas destinados aos adultos procuram benefícios superiores àqueles que frequentam a escola. Os “raros” dados indicam que estes programas são também rentáveis como o ensino básico.

Mais, a exigência de competências maiores em alfabetização, vai de encontro com a mundialização económica, o aumento das migrações internas e internacionais, a rapidez das inovações técnicas onde participam as tecnologias de informação e da comunicação, e a evolução versus uma sociedade de conhecimento. Estas transformações generalizadas significam que é preciso concentrar ainda os esforços sobre a redução do analfabetismo, particularmente nos países pobres e no seio dos grupos excluídos do mundo inteiro, o que constitui objectivo do EPT em matéria de alfabetização. Elas significam também que é preciso visar a melhoria permanente das competências em literacia de todos os adultos.

A língua, as práticas de alfabetização e os ambientes alfabetizados mostram a importância que reveste o contexto social alargado ao seio do qual o indivíduo adquire uma alfabetização durável.

Temos também os jovens no ensino secundário.

Torna-se difícil explicar o que é a juventude e o que significa ser jovem. Trata-se de algo mais do que um modo de “sentir”, agir e actuar em público nos vários sectores da sociedade.

A definição de “jovem” leva-nos a pensar numa fase de transição entre a infância e a inserção na vida activa. Nesta fase, o jovem vai procurando a sua identidade, com normas comportamentais e atitudes próprias que muitas vezes inquietam os governantes, as famílias e a sociedade em geral, uma vez que os jovens apresentam mais perguntas do que respostas. Vivem em contradições, entre o progresso social e a deterioração das suas condições de vida, a pobreza e a riqueza, a unidade e a diversidade de culturas. Há jovens que apelam à sociedade para que gere estratégias e políticas inovadoras e eficazes que toquem a sua condição. Esta, procura – com as suas limitações – condições que favoreçam o papel dos jovens em vários sectores da vida social e cultural, como o acesso ao ensino, ao trabalho e à melhoria de vida. Mas é neste estado de coisas que os jovens se inserem, os problemas do presente (sem resposta) bloqueiam as suas vidas e conduzem muitos à indiferença e ao laxismo.

É a esta luz que devem ser interpretados fenómenos como as taxas de insucesso e abandono escolar, a proliferação das toxicodependências e, em alguns meios urbanos, dos comportamentos marginais organizados.

São reconhecidas algumas limitações, como no sistema de ensino, e há que encontrar respostas diversas (e plurais) que forneçam aos jovens uma parte fundamental das aptidões necessárias a uma intervenção plena na sociedade dos nossos dias. Há ainda que encontrar respostas integradoras que constituam para muitos uma nova oportunidade de formação e de aquisição dos valores cívicos fundamentais.

Do ensino superior é de realçar a qualidade de ensino praticado, que por nós não parece ser favorável ao aluno, por ser um ensino “tradicional”, que não beneficia muito o aluno quando este começar a sua vida activa e ter que tomar as suas próprias iniciativas. De resto é de louvar, a oferta e os desafios que existem hoje em dia em matéria deste tipo de ensino...

[1] “PLANO ESTRATÈGICO PARA A EDUCAÇAO”, PRAIA, Fevereiro de 2003 PROMEF/MEVRH; pp.17

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